Não deixa de ser curioso que a figura do alojamento local foi criada em 2008 pelo Governo socialista de José Sócrates, e teve como missão essencial procurar resolver o problema dos serviços de alojamento que vinham sendo oferecidos a turistas, sem qualquer formalismo e à margem da lei. O foco era permitir a possibilidade da prestação de serviços de alojamento temporário em estabelecimentos que não reunissem os requisitos legalmente exigidos para os empreendimentos turísticos, nomeadamente, pensões, motéis, albergarias e estalagens.
Porque esta medida correu muito bem e o crescimento destas unidades disparou nos anos seguintes, em 2014 o Governo da coligação PSD/CDS procedeu à sua regulamentação autónoma, criando um regime jurídico próprio, onde as exigências para esta atividade foram amplificadas, introduzindo-se o registo obrigatório, a determinação do tipo de exploração, bem como a obrigação do cumprimento de certos requisitos específicos de segurança, higiene e conforto.
A verdade é que o alojamento local se impôs em Portugal por mérito próprio. Aproveitando uma combinação de fatores económicos, sociais e tecnológicos, e o crescimento do turismo em Portugal, o AL posicionou-se como uma alternativa viável aos hotéis tradicionais. A variedade de opções de acomodação, atendendo às diferentes preferências e orçamentos dos viajantes, à flexibilidade nos horários, tornaram o AL numa opção muito procurada por famílias e grupos mais jovens. Com o surgimento de plataformas de compartilhamento de acomodações (Airbnb, Booking, etc) a conexão entre proprietários de imóveis e viajantes ficou mais facilitada e essas plataformas tornaram mais acessível o acesso aos alojamentos, garantindo a sua fiabilidade. E, não menos importante, atendendo ao período de crise vivenciado em Portugal na última década e a um contexto de dificuldades económicas, muitos proprietários de imóveis viram no alojamento local uma oportunidade de gerar valor extra, alugando os seus espaços a turistas.
Naturalmente, há aspetos positivos e negativos. Mas a sua existência justificará tanta celeuma? Inquestionavelmente, o investimento no AL foi a principal razão para a reabilitação urbana e a consequente revitalização de bairros e áreas em declínio, trazendo novos fluxos de turismo e atividades económicas para essas regiões. Consequentemente, a reabilitação de imóveis para AL veio aumentar o valor das propriedades e incentivar outros proprietários a investir na melhoria de suas próprias propriedades, resultando numa melhoria geral na qualidade das propriedades e das áreas onde se inserem, fazendo subir positivamente o valor das propriedades em geral.
Mas porque o AL pode atrair turistas e visitantes para uma área específica, podendo levar a uma maior procura por imóveis que podem ser convertidos em acomodações locais, tal pode impulsionar os preços das casas. E se muitos proprietários optarem por converter suas propriedades em AL, a oferta de casas disponíveis para venda ou arrendamento a longo prazo pode diminuir. E isso pode levar a uma competição mais acirrada pelos imóveis restantes, o que pode levar a um aumento dos preços. Porém, e é justo dizer, tal consequência não é exclusiva aos AL, e o mesmo se poderá dizer de qualquer programa de reabilitação urbana, cuja melhoria das suas habitações levará sempre ao aumento do seu valor.
O que é igualmente incontornável é que, desde que António Costa subiu ao poder, primeiro com a Gerigonça e agora a solo, o ataque ao regime do alojamento local tem sido insistente, primeiro com a subida na taxação e agora com o novo "pacote habitação", que procura castrar, provavelmente, o mais bem-sucedido regime de exploração habitacional comercial em Portugal. O problema é que tudo isto é feito para esconder a incapacidade do seu governo em cumprir as suas próprias metas de construção de habitação social, bem como de aproveitamento do seu extenso espólio imobiliário em desuso.
O AL não pode ser o bode expiatório da incapacidade de António Costa. O foco tem de estar na capacidade de regular bem e com inteligência, procurando equilibrar os benefícios do alojamento local com a necessidade de manter a estabilidade das comunidades, a fim de evitar a sobre-exploração e a especulação imobiliária. Nunca assim e, claramente, nunca com este governo socialista. O tal que querem trazer para a Madeira. Cruzes!!