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Artigo de Opinião

Professora Universitária

13/12/2021 07:01

O que leva a O Caso Mental Português, outro pequeno texto de Pessoa, de 1930, em que o autor percebeu o porquê da ineficácia da receita dada: o provincianismo do escol português, pior ainda o das elites - o deslumbre pelo progresso, sem o construir, a incapacidade de meditação, de análise, de coordenação da emoção, de concentração e esforço, sem auxílio crítico da inteligência e da cultura. Em suma, sem ideias. "Seria trágico, à força de deixar de ser cómico." Um caso coletivo de pouca sanidade mental, no fundo.

A educação sem formação e sem o consequente investimento na capacidade crítica do indivíduo acaba, no fundo, por criar a apatia de um povo que, na sua apropriação simplista do mundo e da sociedade em que vive, se vê melhor do que é, mais rico do que é, mais deslumbrado do que deveria ser. E isto a propósito do espanto que sinto quando se coloca o aumento do salário mínimo, como o está a fazer o PSD nacional e algumas personalidades de vértice do PSD Madeira (ao contrário do PSD dos Açores: enquanto o salário mínimo nacional tem um acréscimo de 5%, o que significa um aumento do valor no continente português de 705 euros, nos Açores o aumento será para 740,25 euros), como perigo para a produtividade da economia portuguesa. Então, afinal, segundo os princípios que nos norteiam de estado construído no direito social, não deveríamos considerar a retribuição do trabalho como justa, isto é, capaz de permitir ter um estilo de vida digno e fora das condições de pobreza?

Se o custo da alimentação básica no nosso país, garantindo apenas a sobrevivência, é de 14,7% do salário mínimo (um custo superior ao de outros países: no Reino Unido é 7%, em Espanha, 12%), se o resto é casa, saúde, educação, transportes, o que fica? Na União Europeia, 10% dos trabalhadores vive em risco de pobreza e isso preocupa a Comissão Europeia.

Na Região, temos o mais alto índice de risco de pobreza, três vezes mais do que a Europa. E isso não nos deve tirar o sono? Juntemos ao panorama 60% de alunos que precisam de ação social escolar, o menor poder de compra do país, a mais alta percentagem de consumo de drogas sintéticas, 10.800 jovens que não estudam, nem trabalham, o menor índice de massa crítica nas ciências, a taxa de menor retribuição por investigador, e, e, e … A ideia de que vivemos numa espécie de paraíso só pode ser um caso mental, ou provincianismo.

Neste momento, alguém me lembrará que, afinal, até há muito trabalho, porque o setor da hotelaria e restaurantes se está a queixar de falta de mão-de-obra. Não falemos dos salários pouco atraentes, os tais que não dão para tudo e que levam os nossos trabalhadores a preferir o salário mínimo de 2.202 euros do Luxemburgo, mas concentremo-nos na educação e formação. Com um turismo constante de séculos, não teria sido inteligente lá no para trás da história pensar numa escola de topo nesta área? Uma daquelas como têm os suíços, os italianos, etc.? Que atraísse os melhores professores, alunos do estrangeiro, dando aos nossos jovens uma formação com padrões de alta qualidade, oferecendo depois salários que refletissem esse investimento?

Ficamo-nos pelo deslumbre, pela vitóriazinha diária propagandeada nos jornais, pelo provincianismo sem mais mundo. Tudo perpetuado por uma educação sem formação, que produz massas que sabem ler e escrever e poucos indivíduos que sabem pensar, que têm capacidade para comparar, contrastar e fazer, de facto, progresso. A organização de Portugal para Fernando Pessoa partia justamente daí: de um olhar informado, analítico do mundo que nos rodeia, sem deslizar para uma visão estreita do que está à nossa volta, achando que o melhor que há somos nós, no nosso quintal, e o nosso vizinho, no quintal dele.

O orçamento da RAM está focado no serviço da dívida, a que vai alocar 600 milhões. Responsabilidades antigas… Seria bom que se pensasse no investimento na verdadeira educação, nos trabalhadores e na sua remuneração justa. Tinha 17 anos, em 1986, quando participei no "Rotary Youth Leadership Award", coordenado pela Dra. Teresa Costa Macedo. Um professor português de Harvard disse, numa das palestras: gostaria que em Portugal os salários de quem trabalha numa loja não fossem muito diferentes do de um licenciado. Porquê?, perguntei. Porque quer dizer que Portugal pode pagar bons salários a todos, os empregados de loja têm formação, o país é rico e viver num país assim é o melhor exemplo de sucesso e felicidade. Quase 35 anos depois, vivemos o nosso caso mental.

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