MADEIRA Meteorologia

Artigo de Opinião

Investigadora

23/03/2022 08:00

Um grande amigo meu, que está neste momento neste violento processo, publicou uma foto nas redes sociais, onde uma série de bonequinhos, em fila indiana, tal pelotão de fuzilamento, aguardavam, resignados, o seu destino. A Heide, o Pedro, o avô e o cão, formavam um conjunto, ladeados pela Miss Piggy, o Sapo e os dois velhos rezingões que, por sua vez, também formavam um grupo. Solitário, o Marco ali também estava.

Um grande sorriso ganhou forma, já que também eu tive alguns daqueles bonecos, nomeadamente o clã da Heide e ainda a família inteira dos Estrunfes, cuja casa, um cogumelo azul, fazia as delícias dos meus companheiros de brincadeira. Faziam igualmente parte da minha coleção a grande maioria dos ícones da Disney - o Pateta, o Donald, a Margarida, o casal Mickey e Minnie entre outros.

Num ápice, a infância de muitos de nós estava ali resumida e certamente cada um guarda a lembrança do tempo longo, à espera da hora de abertura da RTP, antevendo mais um episódio cheio de peripécias. Há quem se tivesse perdido com as histórias da montanha; outros preferiam a Pantera Cor de Rosa e outros ainda, apreciavam os Marretas, não resistindo ao charme de Miss Piggy ou à doçura do Cocas ou ainda ao sarcasmo dos velhos. Haverá ainda quem se tivesse apaixonado pela excentricidade de Gonzo ou pelo urso Fozzie, constantemente se debatendo com a pouca graça das suas piadas. Porém, ao ver a figurinha do Marco, veio-me logo à memória o spot de abertura e a respectiva canção, que uma e outra vez, me faziam chorar compulsivamente, pois o rapazito passava a vida desesperado à procura da mãe, numa tristeza inigualável e para mim, de tenra idade, impossível de compreender. A choradeira era tal, que às tantas, a minha mãe proibiu-me de ver esses "bonecos". Não me lembro qual foi a compensação para tamanha privação, mas a esta distância, só tenho de concordar com tão acertada decisão. É que bastou ver o boneco para voltar a sentir a mesma comoção e me solidarizar com a orfandade do miúdo. Já se passaram quantos anos?

A este propósito, e porque isto da memória é como as cerejas, lembrei-me de a minha mãe também me ter proibido de ver a Malu Mulher, uma série brasileira cuja protagonista, interpretada por Regina Duarte, era uma socióloga paulista, divorciada e mãe de uma adolescente. Naquele último ano da década de 70, uma mulher "desquitada" [era este o termo usado], independente e segura de si, era algo de temível já que abalava a visão tradicional da mulher portuguesa - dona de casa submissa, mulher fiel e mãe de filhos. Portanto, sem mais quês e assim que se ouvia a voz de Simone a entoar "Começar de novo" [e que ainda hoje me faz estremecer] lá ia Cláudia para a cama dormir. Não sabia minha mãe era que eu, deitada no chão alcatifado do meu quarto e, pela fresta da porta, seguia, de olhos esbugalhados de espanto e assombro, o dia a dia de Malu e os grandes dessossegos desta mulher moderna.

Epílogo: há dias, cheguei ao serviço e tinha um frasco de vidro cheio de bonecos. Estão agora, uns no meu escritório, os outros na estante do meu filho. Há heranças que nos enriquecem tanto!

OPINIÃO EM DESTAQUE

88.8 RJM Rádio Jornal da Madeira RÁDIO 88.8 RJM MADEIRA

Ligue-se às Redes RJM 88.8FM

Emissão Online

Em direto

Ouvir Agora
INQUÉRITO / SONDAGEM

Concorda com a introdução de um novo feriado a 2 de Abril do Dia da Autonomia?

Enviar Resultados

Mais Lidas

Últimas