Lendo os jornais locais de terça-feira da semana passada, reinava o otimismo sobre a aprovação do Orçamento da Região para 2025 e, aparentemente, estava tudo tranquilo do ponto de vista político. Até no Chega Madeira e no PS, coisa rara.
Na quarta-feira tudo mudou, com a apresentação de uma moção de censura por parte do Chega.
Nada de novo; voltou a instabilidade, a que infelizmente já nos vamos habituando.
Como primeira consequência, foi cancelada a Cimeira marcada para esta semana nos Açores, que juntaria à mesma mesa o Governo da República e os Governos das duas Regiões Autónomas – um momento histórico –, e onde se esperava que fossem desbloqueados importantes processos pendentes há demasiado tempo.
À primeira vista este facto não terá grande relevância, mas se pensarmos que desse encontro poderia resultar um entendimento que permitisse reduzir a taxa do IVA, aí já se percebe a seriedade da situação.
Mas a principal consequência desta contínua instabilidade será ao nível da execução dos projetos do PRR – um maná de apoios, único e irrepetível, que teremos de executar até ao primeiro semestre de 2026 –, que poderá estar seriamente comprometida, dada a teia burocrática subjacente, que apenas se deslinda com uma administração a funcionar com plenos poderes.
É por isso fundamental voltarmos rapidamente a um quadro de estabilidade.
O caminho para aí chegarmos não será fácil, como todos já percebemos. Resta, pois, esperar que reine a responsabilidade e que os interesses da Região estejam acima de tudo o resto. Porque – e não haja dúvidas quanto a isso – poucas mais oportunidades teremos de reunir à mesma mesa Governos Regionais e um Governo da República com predisposição genuína para resolver os nossos problemas, e, com grande certeza, não teremos mais nenhuma oportunidade para aproveitar as centenas de milhões de euros que o PRR nos colocou de bandeja à nossa frente e que podemos estar em vias de desaproveitar.
Não havia necessidade
O eurodeputado socialista Sérgio Gonçalves foi notícia por estes dias por ter escolhido a esposa do atual líder do PS-Madeira para integrar o seu gabinete. Por mais competente que seja a pessoa em questão, e não coloco isso em causa, a verdade é que a simples ligação familiar com o líder do seu Partido nunca afastará a perceção pública de que esta foi uma nomeação de favor.
Quem ocupa lugares eleitos ou de nomeação, se quer ser coerente com princípios éticos e de boa conduta – como devem ter todos os servidores públicos –, não pode escolher para lugares de nomeação familiares seus, seja nos respetivos gabinetes, seja nas equipas de outros.
Por isso, tanto Sérgio Gonçalves como Paulo Cafofo ficam muito mal na fotografia, ainda mais face aquilo que têm defendido publicamente sobre a conduta dos políticos.
E é pena, digo com sinceridade, porque é também por causa destes episódios que a classe política está tão desacreditada e descredibilizada perante a opinião pública, e que há cada vez mais dificuldade em trazer para a política os melhores da nossa sociedade.
Voltando ao eurodeputado Sérgio Gonçalves, que tem a responsabilidade acrescida de ser atualmente o único eleito da Madeira no PE, espero sinceramente que das próximas vezes que volte às páginas dos jornais seja pelos sucessos que tenha alcançado em Bruxelas na defesa das nossas especificidades. E já agora, que as pessoas que escolheu para o seu gabinete tenham a competência e o empenho suficientes para auxiliá-lo a alcançar esses resultados que tanto precisamos.