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Artigo de Opinião

PALAVRAS APENAS

21/11/2023 08:00

Tudo tem um negativo: branco e preto, sol e lua, dia e noite, vida e morte, música e silêncio. E é, por vezes, no rendilhado desse lugar-outro, muitas vezes noturno, que encontramos o alimento que nos devolve a esperança. Às vezes, é preciso sentir o chão para que o nosso olhar procure as estrelas que hão de indicar o caminho; é preciso escutar os vazios para que o nosso coração se aperceba de que há coisas novas a chegar e que é preciso estar disponível.

Às vezes, o futuro começa no lugar exato onde a dor parece ganhar alento para nos fazer desistir. É lá. Na sombra. Na noite. No chão. Na possibilidade que as coisas impossíveis nos oferecem. Lá, onde o grito se faz canto e o dia amanhece.

Sabemos, porque a vida já se encarregou de nos contar, que é no medo que a coragem rebenta, como se o medo escondesse uma semente capaz de nos tornar mais fortes. Há de ser como a morte que, no seu mistério, guarda a esperança de uma vida mais plena, mais feliz, mais Mais. É na dúvida que a fé se organiza, nesse lugar desconhecido que nos assusta, na incompreensão do que não nos é dado ver.

Proponho, pois, que o nosso olhar se detenha, hoje, nesse lugar que não parece ter sentido: as sombras e os vazios, os silêncios e os fins. Se olharmos bem, há, lá dentro, portas que nos levam a outros lugares, a futuros, à possibilidade de nos encontrarmos com as coisas Maiores que nos explicam o motivo pelo qual andamos aqui.

Temos de aprender como se vai à procura das oportunidades que se escondem no lado de lá da luz e de aprender a escutar as notas guardadas nos silêncios da música, os espaços brancos entre os versos dos poetas, os gestos que o artista não cumpriu.

A estética dos caminhos que nos interrogam são sempre lugares bons. Mesmo que. Sobretudo se. É nesse horizonte que temos de colocar o nosso olhar, nestes tempos em que os gritos de um mundo em guerra nos impedem de ouvir a música que os pássaros compõem nas pautas que riscam os céus. Ainda azuis, os céus. Ainda com pássaros que louvam o princípio das manhãs. Ainda com manhãs a dobrar a curva das (nossas) noites. Ainda.

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