De um lado, o mar; de outro, a terra. De um lado, o sonho; de outro, o chão. De um lado, a possibilidade, do outro, este estar-assim de todos os dias que nos amarra ao ter-de-ser.
A verdade, porém, é que temos (quase) sempre dois caminhos para escolher: ou ir ou ficar. E sabemos muito bem que a vida acontece enquanto decidimos, porque o tempo tem sempre muita pressa e não gosta de esperar.
A vida é feita de caminhos. Que se faz ao caminhar, como cantava o poeta. Que se faz com tropeços e com quedas, mas com vontade e coragem. Que se faz com a geografia dos dias, dos risos e das lágrimas, das alegrias e das dores, das esperanças e dos desencantos. Uma viagem, portanto. E vamo-nos reconhecendo nómadas ou sedentários, conforme as formas que as coisas tomam no quintal do coração.
Por muito que precisemos de mundo e os nossos passos se dirijam para longe da nossa rua, acho que a nossa vontade maior é a de regressar a casa, trazendo, na bagagem, novos mistérios e, nos olhos, paisagens de outros lugares [que vêm no que compramos, no que recordamos, naquilo em que (nos) transformamos].
Quando partimos, fazemo-lo à procura da validação das mitologias que fomos compondo ao longo de nós: os postais que vimos, os filmes que nos emocionaram, os livros que deixaram raízes em nós. Vamos à procura da felicidade, para a trazer no bolso, no regresso.
É o regresso a casa que dá sentido aos (nossos) caminhos, às (nossas) viagens. Vamos para voltar, porque é a casa que ordena os nossos passos e redefine o que se é, o lugar onde alguém (ou uma memória) está à nossa espera para nos ouvir contar o mundo. A (nossa) casa é, afinal, o destino de todos os caminhos. É lá que desarrumamos a mala, para a refazer depois. É lá que o mundo, o nosso mundo, se deita para descansar. É lá que abrimos o mapa e escolhemos um novo destino.
De um lado, o mar. De outro, a terra. Aberta, a porta da nossa casa. É lá que se guarda o chão e o sonho.