Ascenso Simões é gestor, antigo deputado em São Bento e ex-membro do XVII Governo Constitucional, no qual foi Secretário de Estado da Administração Interna, assina uma coluna de opinião no Expresso onde sintetiza muito daquilo que levou ao recente ato eleitoral madeirense, da seguinte forma: “O Chega quer fazer cair o executivo de Albuquerque e Cafôfo, deslumbrado, entra no jogo. Tinha chegado, achava, a sua hora. Só que os madeirenses já tinham desligado a sua ficha, já não suportavam a sua clique, estavam noutra...”
Depois, especificando o seu pensamento, envolve António Costa nas escolhas do PS Madeira, logo a partir de 2018, em que “Costa, no seu permanente tacticismo, acabou por matar dois quadros políticos que podiam ter sido o garante de uma nova realidade política madeirense. Ao fazer de Cafôfo, presidente da câmara do Funchal, eleito numa coligação arco-íris, o centro de tudo errou na estratégia”.
Os quadros políticos a que se refere Ascenso Simões são Carlos Pereira, derrotado por Emanuel Câmara, sendo que então, “Pereira vai ficando pela Assembleia da República e o partido madeirense inicia um processo de endogamia crescente que acaba por marginalizar muitas personalidades que acreditaram inicialmente em Cafôfo. São relevantes nesse caminho de afastamento Bernardo Trindade, João Pedro Vieira, Olavo Câmara”.
Mais, escreve que “Cafôfo não tinha, e não tem, experiência política nem formação partidária para o exercício de funções de presidente do governo regional. Era um autarca que precisava de tarimbar e de se fazer para ambicionar outros voos”.
Na história narrada por Ascenso Simões, seguem-se os acontecimentos de 2019, em que “o governo de Miguel Albuquerque degrada-se, muitos dos poderosos zangam-se com ele, o PSD abre novas guerras internas. Cafôfo vai a eleições e tem 35,7% contra 39,4% do PSD”.
Para aí chegar, “Cafôfo, que não era militante do PS, inscreve-se. Os socialistas aguardam meses até ele poder ser líder regional, entregam-lhe o poder todo”. Conhecidos os resultados, “qual menino rabino, Cafôfo cansa-se do brinquedo. Demite-se da liderança regional, abandona o seu lugar de deputado regional e brinca com o partido através de uma nova liderança que lhe é próxima”.
A partir do território continental, “Costa não esquece Cafôfo. Afinal, o então líder do PS não queria ver a realidade. Fez dele Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, cargo que este desempenhou com pouco primor, mas com enorme autoconvencimento”.
Lê-se ainda que “as eleições autárquicas de 2021, Cafôfo faz a vida negra ao seu sucessor na Câmara do Funchal. Miguel Gouveia e o PS perde a câmara” e que “em 2023, o grupo reduzido que governava o PS Madeira escolhe Sérgio Gonçalves com candidato a presidente do governo regional. Sérgio era (é) um quadro político valioso, mas que não conseguiu livrar-se das amarras apresentando-se como mero emissário. O PS passa de 35,7% para 21,3%, o JPP duplica os votos e o Chega aparece em força. A direção do PS Madeira não tinha aprendido nada, não estava a ver nada”.
Enquanto tudo isto acontecia, “Carlos Pereira continuava a ser o Senhor Madeira na defesa dos interesses da região em Lisboa. As percentagens de aprovação do seu desempenho revelavam-se nas votações que o PS teve em 2019 e 2022”
Ascenso Simões recorda ainda o fracasso socialistas em 2024, já com Cafôfo, que “meteu na cabeça que vai haver um dia em que os votos do PS e do JPP vão chegar para se construir uma geringonça e ele será presidente. Mostrou, mais uma vez, que de política nada entende”.
“Não contente no seu autoconvencimento, faz uma guerra nas eleições nacionais de 2024. Corre com o único ativo valioso da Madeira e elege-se deputado nacional. Ninguém lhe disse que era mais um prego no caixão. O homem via a Quinta das Angústias, também conhecida como Quinta da Vigia ou do Lambert, como o seu destino manifesto, todo o caminho era dele. No Largo do Rato houve o bom senso de salvar Carlos Pereira, de o manter ativo em defesa da Madeira”, escreve ainda sobre Cafôfo, numa referência ao facto de não ter colocado Carlos Pereira na lista pelo círculo da Madeira.
Agora, despois do descalabro de domingo, “a estratégia é simples – aguentar até às autárquicas para dar lugar a Célia Pessegueiro. Tenho excelente apreciação da presidente da câmara de Ponta do Sol. Só que existe o problema de ser casada com Vítor Freitas, ex-presidente do PS Madeira que, apesar de uma coligação alargada, fez do PS a terceira força, atrás do CDS, em 2015”.
Contudo, alerta que “um autarca nem sempre é a boa solução para um governo regional se não vier da sociedade civil, se não tiver uma vida de entendimento da economia e da sociedade. Pessegueiro será sempre uma excelente dirigente do PS e até uma boa governante, mas está longe de ter a dimensão para se constituir como alternativa”.
Antes de ressalvar que a sua opinião “não é um ataque pessoal, antes um alerta, um ponto de situação, sem espinhas, como a hora obriga”, Ascenso Simões deixa um conselho: “Paulo Cafôfo, Vítor Freitas, Jacinto Serrão, Miguel Iglésias, Rui Caetano, Sara Cerdas, Isabel Garcês são pessoas que marcaram o PS, que terão sempre um papel num futuro em que o PS chegue ao poder. Mas devem ponderar se faz sentido continuar num caminho de completa irrelevância”.