Num mundo caracterizado por grande interesse pelas questões de saúde psicológica e bem estar, mas também pelo “empoderamento” e o potencial de cada um, não é surpreendente que exista muita oferta de serviços que visam ajudar as pessoas a alcançarem os seus objetivos ou a lidarem com os desafios da sua vida. É expectável que assim seja - se há necessidades, há oferta de serviços.
Nesta abundância, a grande tarefa é distinguir a qualidade do que é oferecido. Porque, se qualquer um de nós tem a liberdade de escolher que lhe seja prestado um determinado serviço, também é essencial que saibamos o que realmente estamos a comprar e quem é que o está a prestar. O muito falado coaching é um bom exemplo: é um método de intervenção útil e com resultados; mas nem tudo é coaching (embora possa ter esse rótulo) e não é qualquer um que é coach (embora se possa apresentar como tal).
Estamos, assim, perante duas questões-chave: que tipo de intervenção está a ser oferecida e quem é que a está a realizar. Em relação à primeira, temos defendido a necessidade de serem valorizadas intervenções que tenham um compromisso com a ciência (e não pseudociência). Digamos que, da mesma maneira que ninguém quer um medicamento que não tenha qualquer demonstração de eficácia, eficiência ou de efeitos nocivos, qualquer outra terapia não farmacológica deve reunir evidências, entre outros, acerca dos seus efeitos (ou ausência deles) e de como funciona.
Quanto aos agentes que protagonizam as intervenções, é essencial que sejam realizadas por quem realmente sabe o que está a fazer. Mas não confundamos confiança com competência (até porque, como se observa frequentemente, quanto maior a incompetência, maior a confiança). Nem confundamos pessoas que fizeram uns workshops e umas formações, ou que até não fizeram nada e acham que têm perfil para “ajudar” pessoas, e pessoas que têm uma profissão, o que pressupõe muita coisa, sendo uma delas saber utilizar determinados métodos e técnicas de forma ética. E no mundo da saúde mental e do bem estar isso é bem evidente. Sim, há uma enorme diferença entre profissionais que têm formação e estão vinculados a um código deontológico, e uma pletora de falsos coaches, de mentores intuitivos, de mental health trainers, de especialistas em felicidade, pessoas que podem ser tudo - só não são é psicólogos - e que se caracterizam pela ausência de formação, a ausência de escrúpulos, o atrevimento, a atração pelo palco e a apetência para mudar de profissões sem esforço, para usar os cinco “A” referidos por Jaime Ferreira da Silva, Presidente do Conselho de Especialidade de Psicologia do Trabalho, Social e das Organizações da Ordem dos Psicólogos Portugueses.
Precisamos menos de métodos obscuros ou que até são apresentados de forma sexy, que oferecem soluções simples para problemas complexos, que dizem que basta querer para poder, que não resultam, e que de forma perversa, ao não resultarem, atribuem a culpa às pessoas porque não quiseram o suficiente. E precisamos mais de serviços e profissionais qualificados e valorizados, que têm acesso a recursos para a sua intervenção, que organizam a sua ação num quadro ético e deontológico. Profissionais que, entre o compromisso individual em serem competentes e a responsabilidade das organizações em que estão inseridos, podem servir melhor as pessoas e a comunidade.