Ouve-se o silêncio nos lugares dos restos. É um silêncio pesado, um silêncio de pedra fria.
Não, não vou escrever sobre sítios arqueológicos (não saberia), mas sim sobre ruínas, sobre aquilo que resta, quando o que foi já não existe. Mesmo que, às vezes, não queiramos ver, o presente sustenta-se sobre as ruínas do passado. A verdade é que não podemos renunciar a esse chão, mesmo que nos perturbe a aparente ausência de vida. Andar sobre os escombros (das casas, de nós) pode representar um regresso às noites, não necessariamente vazias de emoções ou de espanto. É o tempo que se planta nesse chão e, com ele, tantas histórias, tantas memórias, tantos instantes quebrados pelas coisas da vida, tanta gente que caminhou pelos mesmos lugares, que se sentou nos mesmos bancos, que viu exatamente as mesmas paisagens.
Há muitas ruínas que seguram as raízes das coisas novas, que são pretexto para construir o futuro. Só é preciso ouvir o que elas têm para contar, permitindo-nos recuperar algumas perguntas que nunca ousamos fazer, acolher as ausências que nelas habitam, aprender as suas fragilidades, descobrir as feridas e as cicatrizes e, aí sim, começar a reconstrução. Afinal, as ruínas podem ser metáforas da nossa existência, enquanto mundo, enquanto humanidade, enquanto pessoas.
A verdade, porém, é que temos medo de olhar o que nos dói. E as ruínas doem sempre. Mesmo que. Olhar as ruínas implica receber, no peito, o vazio, a vulnerabilidade, o fim, para poder reconstruir a partir desse chão-pedra-raiz que pode sustentar o que está para ser criado, de novo. A partir do que existe. Muitas vezes destroços. Mas alicerce.
Ainda nos falta sentir os fins como princípios... As ruínas da História, por exemplo. Ou a morte. Reconhecer as nossas ruínas há de ser já sinal da nossa reconstrução.