O parlamento chumbou hoje várias propostas do PCP de alteração da legislação laboral, numa votação na generalidade que os partidos à esquerda do PS disseram ser um teste para eventuais acordos após as legislativas.
As propostas em questão incluíam acabar com o regime de caducidade da contratação coletiva, a reposição do princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, o aumento do pagamento do trabalho extraordinário em 50% na primeira hora e 75% nas horas seguintes em dias úteis ou ainda a limitação no recurso ao sistema de turnos ou de trabalho noturno.
Todas estas medidas foram chumbadas com os votos contra do PS, PSD e IL e votos favoráveis do PCP, BE, PAN e Livre. O Chega votou contra a reposição do tratamento mais favorável do trabalhador e o fim do regime de caducidade da contratação coletiva e a favor nos diplomas relativos ao trabalho por turno e noturno e aumento das horas extraordinárias.
Na abertura do debate que antecedeu esta votação, o deputado do PCP Alfredo Maia desafiou o PS a aprovar estas medidas, perguntando que “prestação de contas” é que os socialistas pretendem dar aos trabalhadores, “depois de terem passado várias legislaturas a frustrar as suas legítimas expectativas” e de terem “desperdiçado uma maioria absoluta”.
“Esta é a oportunidade para, especialmente o PS, emendar a mão e viabilizar os projetos de lei que o PCP volta a apresentar”, afirmou.
Em resposta a esta intervenção, o deputado do PS Gilberto Anjos defendeu que, nesta legislatura, foram alcançados “avanços significativos” na proteção dos trabalhadores, designadamente através da aprovação da chamada Agenda do Trabalho Digno, perguntando a Alfredo Maia se não considera “importante conferir estabilidade e previsibilidade à legislação laboral”, tendo em conta que foi alterada recentemente.
Também o deputado socialista Fernando José defendeu o balanço do executivo, salientando que, nos últimos oito anos, foram implementadas medidas como a reposição das 35 horas semanais na administração pública, foram devolvidos cortes salariais e subsídios de Natal e férias, além de se ter densificado “o equilíbrio das relações laborais”.
Esta intervenção mereceu uma crítica direta da parte do deputado do BE José Soeiro, que deixou um conselho ao deputado socialista: “Se o PS quer construir soluções de futuro, em vez do autoelogio, devia fazer um balanço crítico da maioria absoluta”.
“Escolher o lado do trabalho não é uma retórica nem uma abstração, são decisões concretas e veremos quais serão as decisões concretas que o PS vai tomar hoje neste debate”, disse.
O deputado do PSD Nuno Carvalho agradeceu ao PCP pelo “entalanço que dá ao PS” ao ter agendado este debate, salientando que é “fundamental que se perceba se o PS, que traçou linhas vermelhas com o PCP no passado” sobre legislação laboral, pretende agora apagá-las para “ressuscitar a ‘geringonça’”.
A eventualidade de uma reedição da ‘geringonça’ foi um dos principais pontos de ataque do PSD, com a deputada Joana Barata Lopes a questionar “onde é que está a estabilidade da esquerda” se o PCP e o BE continuam a considerar cruciais diplomas que o PS rejeita e que provocaram desentendimentos durante a ‘geringonça’.
O líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, considerou que o PCP “não tem moral nenhuma para falar de trabalho”, uma vez que, entre 2015 e 2021, “andou a aprovar orçamentos do PS”, e atribuiu-lhe responsabilidade pela “maior carga fiscal de sempre” e por “quatro milhões de portugueses estarem no limiar da pobreza”.
Pela IL, a deputada Carla Castro criticou as propostas do PCP, considerando que a “flexibilidade e adaptabilidade devem ser a regra” no mercado de trabalho e que a “rigidez conduz à precariedade e prejudica o dinamismo e oportunidades”.
A deputada única do PAN, Inês de Sousa Real, considerou que ainda há “um longo caminho a fazer” no mercado laboral e comprometeu-se a voltar a apresentar propostas como o reforço dos direitos de parentalidade, a licença menstrual de três ou mais tempo de lazer e descanso para os trabalhadores.
Já o deputado único do Livre, Rui Tavares, ironizou com o facto de a direita “ameaçar com o regresso da ‘geringonça’”, salientando que foi o Governo que “deu maior satisfação aos portugueses”, e disse achar “muito bem que esteja em cima da mesa e na urna de voto nas próximas eleições escolher entre mais direitos e menos direitos no trabalho”.