Comemorou-se o dia da Região e das Comunidades Madeirenses.
Tradicionalmente indica-se esta data, 1 de julho, como aquela que assinala o povoamento da Madeira, um ano após o desembarque no Porto Santo. Reza a lenda que após uma forte tempestade os corajosos navegadores teriam encontrado recolha naquela ilha a que batizaram de Porto Santo. Não sendo a História uma ciência exata, a verdade é que e ilha do Porto Santo já surge referida em documentos do Sec. XIV pelos nomes “Leiname”, “Diserta” e “Puerto Santo”.
Certo é que foram os portugueses com a sua mestria, valentia e audácia que tornaram estas duas ilhas, uma povoada por coelhos, outra por árvores, que lhe inspiraram o nome, em terra de gentes.
De terras áridas, no Porto Santo, cultivaram-se cereais guardados em matamorras que também se escondia gente, dos ataques de piratas e corsários, que muitas famílias destroçaram com raptos e mortes.
De terras pejadas de florestas intransponíveis, vales e montanhas, cursos de água e mar revolto, na Madeira, revelaram-se poios arados, levadas lapidadas na rocha alta e casas a beijar o penhasco.
Como diz o Hino, do Vale à Montanha, Teu povo Humilde, Estoico e Valente.
Não tem assim tanto tempo, que das Costas de Baixo até ao Funchal se apanhava um barco, que na Ponta da Cruz se perdeu um e com ele as almas que transportava.
Não tem tanto tempo assim que homens e mulheres nasciam e morriam sem passar os limites do seu concelho, formando micro comunidades com seus hábitos próprios, sotaques e regionalismos que enriquecem, hoje, a multiculturalidade madeirense, a tal madeirensidade a que se debruçam doutores e intelectuais.
Não tem tanto tempo assim que por via de regimes totalitários perigosos e suas consequências os nossos bisavós e avós, se calhar pais, tiveram de fugir da sua terra à procura de novos horizontes.
Tinha 14 anos, um adolescente praticamente imberbe, quando saiu “sem papéis”, dos fundos dos vales, rumo a Moçambique e daí, de camião fechado, em camião fechado, até a África do Sul, para tentar a sua sorte. Sem “direitos” trabalhou clandestinamente em restaurantes, no que aparecesse, até ser denunciado e tentado fugir pelas traseiras saltando o muro. Não conseguiu, foi apanhado e deportado para Angola, então, portuguesa, o menino imberbe de 14 anos, onde viveu num celeiro, quase em cativeiro até se conseguir libertar, ir à cidade, comprar passagem e voltar para casa. Que terror passou aquela criança? Que tormentas carregou para a vida?
É desta têmpera que se faz o madeirense, da resiliência, do esforço e da perseverança.
Estipulou-se essa comemoração no dia 1 de julho, fazendo coincidir a data com aquela que se designou como sendo a do povoamento da Madeira.
Muito mudou nas últimas décadas e pelos investimentos feitos, podemos nos dar ao luxo de viver na capital e trabalhar em qualquer ponto da ilha, sem ter de fazer percursos de horas por estradas sinuosas e saquinhos, não vá o diabo tecê-las e os amendoins e tremoços vendidos à janela da camioneta quererem retornar à proveniência, ali pela subida do Estreito.
Diziam os do Campanário que quando viam A Quinta Grande já ficavam contentes, estavam perto de casa. Os de mais oeste, quando viam a Ribeira Brava para a indispensável paragem técnico hidráulica, porque pela frente tinha mais uma hora de caminho e ao que seguiam para a Boaventura, duas ou mais, porque ainda haveriam de subir e descer a Encumeada. Antes do Norte se ter ligado ao Sul por entre rochas e águas ferventes.
Se por dentro estamos bem, comparativamente ao passado recente, para a República não se poderá dizer o mesmo... de Ilhas Adjacentes a Regiões Autónomas, mais que o estatuto ainda não conseguimos o respeito, a prossecução plena do princípio da continuidade territorial, sem aproveitamentos da nossa inexorável insularidade e do nosso pseudo isolamento.
Precisamos de soluções ao nível da operacionalidade do aeroporto, de alternativas, como a pista do Porto Santo e o posterior transporte por via marítima.
Precisamos cuidar dos nossos, para que a nossa terra não se transforme numa estância de férias onde não se consegue comprar casa, onde não se arranja trabalho qualificado, de onde só apeteça fugir, porque uma ida à serra, uma caminhada relaxante rapidamente se transforma num pesadelo de engarrafamentos e resgates.
Eu quero uma Madeira que seja tão tua, como minha.