“Quando um dia eu for embora
Quando então me despedir
Pedirei apenas silêncio”.
(Pablo Neruda)
Encontrei-me com um grupo de estrangeiros que escolheram o Porto Santo para viver. Sentamo-nos na tarde a falar de nós e deste lugar que tem silêncios pendurados nos caminhos e que (ainda) nos permite abrandar da loucura dos dias.
A ilha escolheu-os para que fizessem dela a sua casa. Aceitaram o silêncio que ela lhes oferece em cada manhã, quando o sol faz de prata o mar e o tempo se abre, no vagar de quem não precisa de correr. Vieram do mundo para ficar ali, naquele canto louro de azul turquesa, inebriados de sossego. Ou de paz. Ou de uma qualquer coisa que os fez acreditar que aquele seria o seu lugar. Talvez o tempo. Ou o silêncio.
Viajantes, andaram à procura de um lugar para ficar, um lugar que fizesse sentido, no contexto das suas vidas, das suas solidões, da vontade de encontrar uma casa que se tornasse também de dentro. E o Porto Santo (ainda) é um lugar assim: de dentro.
Conversamos entre silêncios, escolhendo as palavras certas, apenas as necessárias. E percebi, com eles, que só o silêncio pode organizar os vazios, separar os escombros dos tesouros, quando nos dedicamos à arqueologia da existência e que, com ele, é mais fácil eliminar o que não é essencial. E há alturas da vida em que só importa o que é essencial. O resto...
Na vida desta gente, o silêncio tem a forma de um lugar. Recolheram-se ali, pensaram-se ali, encontraram-se ali. Reconheci-lhes a coragem. Eu sei que o silêncio é como a saudade, permite-nos contemplar a ausência. E isso nem sempre é fácil.
O silêncio posiciona-se entre a ida e volta do sentido – no espaço em branco entre os versos, no intervalo da música. Traduz o que as palavras não dizem e sustém a vida. O silêncio é estrutural. Organiza. Organiza-nos. É a folha branca onde se pousam as palavras. É o lugar da escuta.
Estava ali gente de muito mundo. Ensinaram-me a possibilidade de se escolher o silêncio e de, nele, construir a paz.