Valência acordou há 48 horas com as primeiras notícias e imagens da destruição e do caos nas estradas causados pelo mau tempo, um cenário que ainda se mantém em várias pontos da província e nos acessos à própria cidade.
Numa das circulares de Valência, a V-31, ao final da tarde e início da noite de terça-feira, centenas de pessoas ficaram presas dentro de carros arrastados pelas águas quando regressavam a casa do trabalho.
Já estavam ali quando os telemóveis soaram com a mensagem da proteção civil a avisar da tempestade e o alerta chegou tarde demais. Várias das mais de 150 mortes já confirmadas pelas autoridades, na Comunidade Valenciana, no leste de Espanha, ocorreram nesta estrada, que tem várias faixas em cada sentido.
Os carros e até camiões acabaram abandonados, amontoados, empilhados uns nos outros, misturados com ramos e vegetação que as águas arrastavam também. Dezenas de carros assim continuavam e no mesmo local, 48 horas depois da tempestade, na quinta-feira ao final da tarde, quando a Lusa percorreu a V-31 no sentido inverso, em direção ao centro da cidade de Valência.
As faixas do sentido para entrar em Valência foram já totalmente limpas de lamas, vegetação e lixo, que foi encostado na berma, e divididas a meio, provisoriamente, para permitir a circulação nas duas direções.
Do outro lado, havia equipas e maquinaria a mover carros e a remover escombros, mas a empreitada é de execução lenta e difícil, como acontece nas localidades da província que foram invadidas na terça-feira à noite por correntes de águas que lançaram os carros contra muros e casas e fizeram pilhas de automóveis.
“Olha para isto e pensa o tempo que vai demorar a limpar”, disse à Lusa na quinta-feira de manhã uma moradora de Paiporta, a cidade nos subúrbios de Valência em que morreram pelo menos 62 das vítimas confirmadas.
As ruas de Paiporta, onde vivem cerca de 25 mil pessoas, continuam a ser rios e pântanos de lama e os carros destruídos e empilhados estão por todo o lado. Os moradores estavam conscientes na quinta-feira de que tinham de ser eles próprios a lançar mãos à obra para as primeiras tarefas de limpeza e de que tinham também de ter paciência, porque as equipas dos serviços de emergência eram poucas para já.
Dezenas de moradores de Paiporta percorriam também a pé quilómetros de estrada para ir comprar a água potável que há dois dias não têm e alimentos, porque não há qualquer comércio a funcionar na cidade, por todas as lojas e supermercados terem ficado destruídos ou terem sido saqueados.
Na quinta-feira, o presidente do governo regional da Comunidade Valenciana, Carlos Mazón, pediu o reforço dos meios das Forças Armadas espanholas no terreno para ajudar nas tarefas de limpeza e remoção, atendendo à dimensão dos estragos.
Ao final do dia o Governo de Espanha anunciou o envio de mais 500 efetivos da Unidade Militar de Emergências, especializada em resposta a situações de catástrofe. Com este reforço, serão cerca de 1.700 os militares desta unidade já enviados para o terreno, que se juntam a mais de 2.000 polícias nacionais e guardas civis.
A V-31 é apenas uma das mais de 120 estradas ainda com cortes 48 horas depois do temporal no leste de Espanha, a maioria delas, na Comunidade Valenciana, a mais afetada pelo mau tempo e onde estão confirmadas quase todas as vítimas mortais.
Segundo um balanço oficial feito ao final do dia de quinta-feira, a maioria das estradas afetadas são vias secundárias, mas há pelo menos duas autoestradas ainda cortadas (A-3 e A-7).
O temporal danificou também vias de metro de superfície e de comboio, incluindo as de alta velocidade, que ficarão sem serviço pelo menos durante duas a três semanas, segundo o Governo espanhol.
A rede de comboios suburbanos de Valência tem uma situação “gravíssima”, com três das cinco linhas “desaparecidas” e cerca de 80 quilómetros “completamente destruídos”, disse o executivo nacional.
Ainda segundo as autoridades, centenas de milhar de pessoas estavam ainda sem telefone, Internet e eletricidade na quinta-feira, em toda a Comunidade Valenciana.
O presidente do Governo espanhol, Pedro Sánchez, garantiu na quinta-feira, num visita a Valência, toda a colaboração “por terra, mar e ar” à Comunidade Valenciana e durante o tempo necessário.
Sánchez reiterou também que teve a oportunidade de falar com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e que “todos os Estados-membros da União Europeia fizeram um esforço, oferecendo recursos para responder o mais eficazmente possível a esta tragédia”.
“Estamos gratos por esta solidariedade”, acrescentou, desconhecendo-se porém se Espanha aceitou alguma dessas ofertas de ajuda.